(im)Perfeição
Uma enxurrada de sentidos e sentimentos acontece durante o encontro entre o médico e o paciente; a poesia pode ajudar a entender (e a sentir).
Desisti de tentar.
Senti-me como meu próprio algoz.
Não consegui mais suportar
buscar a perfeição em todos nós.
Um reflexo límpido, quieto e tranquilo,
um espelho líquido, fiel, mais-que-perfeito.
Porém, quando me aproximo daquilo, atroz,
uma gota de sangue, com pesar,
um breve suspiro cruel, de dentro do peito,
perturba a superfície da fina lâmina d’água - nossa existência.
E me afogo na minha própria imperfeição,
falsa imagem de permanência.
Reconheço o eterno pelo transitório.
Afinal, nós - e as estrelas, que na noite ascendem no céu -
somos iguais,
pois eu acendo minha consciência.
Sou tudo, e sou nada.
Apenas não se aproxime demais.
Mas, médico, examino, observo, percuto, palpo – tenso.
Ausculto, toco, cheiro – penso.
Preciso conhecer; não é o suficiente jamais.
Necessito me aproximar e sentir,
mais perto, muito perto, não deixar partir.
Aproximação de sentido entre dois entes imperfeitos.
Sentido como meta-objetivo.
Sentido no íntimo.
Como empatia que desenvolve os sentidos,
agora afinados à diagnose de sutis
sinais, sintomas e afins.
Como pensam, como falam, como agem - como comem. Como vivemos.
O que não pensam, não falam, não agem, não comem. Como morremos.
O que há, e o que falta haver.
Por dentro, por fora, deitado, ortostático,
de todos os lados: medial, sagital, estático.
Nada pode escapar à minha mente.
No entanto, nunca será suficiente,
Porque, se chego perto demais, em pranto,
meu paciente, meu espelho, minha imagem,
me afogo em mim mesmo - imperfeito.
E não existo mais, reles miragem.
Somente restam as estrelas.