We are the three sisters. We have our blind eyes on you since your very beginning, and we will last until the humankind’s fall without meaning. Clotho, Lachesis and Atropos. We spin, measure and cut the thread of mortals and gods We are the Fates of all, inexorable Behold the landscape in your placid eyes Beware the insidious, unreasonable minds Doesn’t matter what you feel or hide inside your heart We don’t care if you lie or stand still in your art We are the eternal Sisters, Moirai, and shall cut the line of your life Cry or not, we take part. The only exception, just a few would deserve, Is the Tavern, In the middle of nothing, Where the compass points to nowhere. There, a timeless, unique secret refuge, You may persist in the fog of time, untouched. RT Schulz
Uma placa de madeira pendia acima da pesada porta oval da taverna. A sua inscrição entalhada, Line of Life, carmesim, ao lado do desenho em baixo relevo de três mulheres fiandeiras, uma delas portando uma lâmina, era visível graças à parca luz amarela da lamparina pendurada sobre a entrada quase oculta.
Lá dentro, uma penumbra acolhedora. O aroma de sopas, cuscuz e frutos do mar se mesclava ao cheiro de tabaco e vinho, e sons de vozes e música orquestral preenchiam o ambiente. Ao fundo um gramofone tocava Cavalgada das Valquírias, de Richard Wagner, pela Filarmônica de Berlim, conduzida pelo competente James Levine.
Ambiente familiar, onde a presença de maus elementos jamais era tolerada. Poucas mesas circulares circundavam a mesa principal central, ladeadas por um balcão retangular de mogno trabalhado no extremo oposto à entrada. Quatro lindas meninas debruçavam-se sobre equações e tarefas de matemática, embora uma delas desse mais atenção às páginas do espesso livro à sua frente, sentadas em uma mesa de canto ao lado de uma lareira com mais cinzas do que brasas e servidas de xícaras de porcelana com ChocoLeite morno.
Já na mesa de centro, quatro homens entre a quarta e sexta décadas de vida partilhavam suas refeições. Famosa tanto pela reputação de suas iguarias quanto de seus clientes, a taverna jamais foi superada nos dois quesitos. Alguns os chamam de pensadores, outros de filósofos, cientistas, mas não importa. O que realmente importa é que esta taverna era - e ainda é- extremamente peculiar, não somente pelos seus fregueses ilustres, mas porque um capricho do destino fez com que ela possuísse a capacidade de reunir pessoas de locais e épocas distintas, uma espécie de ponto de interseção no tempo e espaço — mas somente aos sábados.
Outros dois elementos também estavam presentes, porém de natureza evidentemente oposta. Um deles, um homem de aparência estranha, sentado na penumbra perto da parede mais distante, escutava atentamente a conversa de todos. Em silêncio fumava seu cachimbo de haste longa, curiosamente entalhado. Vestia botas de couro enlameadas, que pareciam já ter vencido muitos caminhos corretos e, quem sabe, alguns descaminhos também. Um manto pesado, verde-acinzentado com capuz lhe encobria a fronte, exceto o brilho fantástico dos seus olhos penetrantes e incisivos mais evidentes ao tragar o cachimbo.
O outro homem, um senhor de meia-idade, cabelo rareando, sentava-se ao lado do balcão das bebidas, com uma expressão tranquila em seu semblante, blazer bem cortado e camisa de gola branca, bem passada. Servia-se de queijo Morro Azul de Pomerode e castanhas, e dialogava com o gerente atrás do balcão. Este distribuía os pedidos e as bebidas com seu avental de couro curtido de bezerro e pano sobre o ombro. Meticulosamente asseado, longilíneo e com cabelos levemente grisalhos, exibia fotos de jogadores de football, algumas autografadas, que dividiam as prateleiras com garrafas de variadas formas e conteúdos.
Versos manuscritos com tinta nanquim na contracapa do que parecia ser um cardápio emoldurado podiam ser lidos defronte às taças e copos:
By mourningvoicestongues The Death of the poet was kept from his poems. The current of histhoughtsfeelings failed; he became his admirers. The words of a dead man Are modified in theheartsguts of the living W.H. Auden
Já o garçom de avental verde-escuro era um pouco mais baixo, de cabelos castanhos e olhar compassivo, deambulava de um lado a outro para satisfazer seus clientes exigentes, com seu lápis atrás da orelha e bloco de anotação — e, quem sabe, ouvir e participar (e registrar, por que não?) de uma conversa ou outra.
Quatro regras implícitas os clientes tradicionalmente seguiam. Dentro daquele recinto, o livre pensamento e a livre palavra reinavam. Dizem à boca pequena que reputações foram construídas - e também destruídas - ali; a única arma possível eram as mentes afiadíssimas, seja para ataque ou legítima defesa.
Segunda regra: bons modos à mesa eram exigidos dos cavalheiros e das damas, sob pena de serem gentilmente convidados a se retirar. Etiqueta é considerada filha menor da ética, e um bom princípio.
Terceira: ao final da noite, o vencedor do debate informal que ocorria à mesa central era eleito por maioria simples pelos participantes. Seu benefício seria o de não pagar as custas, por vezes elevadas, mas à altura dos prazeres gustativos.
E, por último, nada do que se dizia ou acontecia ali poderia ultrapassar os umbrais da taverna. Pelo menos não formalmente. Mas a verdade é que muitas teorias e pensamentos de várias épocas da humanidade tiveram ali, naquele ponto específico do espaço-tempo, a sua semente. Assim se erigiu um local único e protegido de florescimento de ideias próprias, difusão e síntese de sabedoria de muitos, passada a limpo.
Continua…